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Categoria: Resenhas Page 17 of 36

Dezoito de Escorpião – Alexey Dodsworth


Devo confessar que ainda conheço muito pouco do que existe de Ficção Científica escrita por autores brasileiros. Dito isto, penso que Dezoito de Escorpião é um dos livros de FC mais ambiciosos entre os nacionais e que me deixou uma forte impressão.

O livro narra a jornada de Arthur, um jovem estudante de história que é atormentado por uma doença que todos os médicos falham em diagnosticar, mas que se manifesta por súbitos surtos de dor. Assim como ele, vemos alguns outros jovens problemáticos como Martin e Lorena também possuem uma condição que os levará a se envolver na trama principal do livro.

Outro personagem que surge já no início dando um tom de mistério para o pano de fundo da trama é o Doutor Ravi Chandrasekhar membro de uma organização conhecida apenas como Areté, aparentemente um grupo de pessoas muito preocupada com determinadas descobertas astronômicas, assim como logo se vê, interessados também em jovens como Arthur, Martin e Laura.

Então quando Ravi se encontra com Arthur e propõe explicações para sua condição, que a trama começa a se desenrolar. Valendo notar que

Torna-se um pouco difícil penetrar nos temas abordados no romance sem enveredar pelo caminho dos spoilers, e vemos no livro alguns temas existentes na ficção científica tais como exploração espacial, poderes psíquicos e transumanismo. Um aspecto interessante da forma que o romance foi construído é que novos temas vão sendo introduzidos em camadas ampliando a complexidade da trama. Acredito até que a quantidade de temas foi ligeiramente excessiva, podendo em algum momento sobrecarregar o leitor com tantos assuntos. Não obstante, a trama, após uma introdução contando com múltiplos pontos de vista, segue um rumo mais linear em torno da trajetória de Arthur. Outro aspecto que pode deixar o leitor um pouco frustrado é o fato de nem todos os acontecimentos da trama serem explicados, mas o autor explica que o leitor poderá matar, em parte, sua curiosidade lendo o romance relacionado O Esplendor (que está aqui na minha fila de leituras).

Vale advertir que o tom do romance é um tanto sombrio, contendo algumas passagens de violência física e psicológica. Frente a isso, recomenda-se para leitores mais maduros.

Alexey Dodsworth tem um prosa bem consistente e consegue construir personagens interessantes críveis. Além da ousadia na seleção de temas, e construção da trama, é um romance que mostra as qualidades que o levaram a conquistar o Prêmio Argos em 2015.

Uma coisa que gostei na leitura, foi o fato de ter tido umas duas ou três surpresas, ou mesmo, inversões de expectativas. Outra coisa legal é que o autor ancora boa parte das premissas dos aspectos de ficção científica em fatos (muitos para mim desconhecidos) que podem ser verificados e estudados pelo leitor. O próprio autor encoraja o leitor a pesquisar a respeito das referências por ele selecionadas. Isso constitui um outro ponto positivo da obra que é estimular o leitor a aprender algumas coisas novas. Somado a isso, o tipo de final do livro, em aberto, mergulhado na ambiguidade, convida o leitor a exercer sua imaginação.

Fica minha recomendação para a leitura dessa obra instigante e que mostra alguns bons aspectos do gênero de ficção científica.

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Coração de Aço – Brandon Sanderson

Finalmente voltando a ler um de meus escritores favoritos! Brandon Sanderson não decepciona, apesar do livro não ter sido um dos meus favoritos. É uma romance de fantasia voltado para o público jovem adulto.

Coração de Aço é um super-vilão implacável, líder de uma gangue de humanos super poderosos que se auto proclamou governador da cidade de Nova Chicago.

O livro é o primeiro de uma trilogia que sai no Brasil pela editora Aleph.

O mundo mudou depois do aparecimento nos céus, da estrela vermelha que foi batizada como Calamidade. Após seu surgimento, algumas pessoas ao redor do mundo devolveram poderes, porém, todos os que experimentaram tal poder eram corrompidos usando-os apenas para o mal.

Neste cenário, conhecemos David, um jovem que perdeu o pai quando criança e viu que Coração de Aço podia ser ferido. Ele é um jovem adulto que se dedicou a estudar as fraquezas dos vilões e agora deseja integrar uma equipe que se dedica a matar super poderosos, também conhecidos como Épicos.

O livro é descrito em primeira pessoa e David é um protagonista inseguro e um pouco engraçado na medida em que descreve tudo com metáforas horríveis. É também uma história de super-heróis e adere bem a alguns aspectos do gênero, mas realmente havendo um toque sombrio na realidade criada pelo autor.

O narrativa evolui em torno de três aspectos, cenas de ação e perseguição, o desvendar de um mistério (qual a fraqueza de Coração de Aço) e o desenvolvimento do relacionamento de David com os Executores. Há um aspecto de grande desafio e adrenalina persistentes, uma vez que vemos um grupo de humanos normais lutando contra seres super poderosos.

O livro tem um desfecho satisfatório e dá ao leitor uma experiência de imaginar e vivenciar um mundo parecido com o nosso no qual a presença de seres super poderosos faz tudo se converter num pesadelo. Mesmo não sendo um de meus favoritos é uma boa pedida.

Guerra do Velho – John Scalzi

Sério, há muito tempo não lia um livro de ficção científica tão bom quanto esse. Uma palavra me veio à mente antes do final da leitura: elegante.

É de fato, uma obra escrita de forma elegante. O autor tem ótimo domínio da apresentação dos personagens e elementos da trama. Consegue fazer uma ótima progressão, daquele tipo que você quer realmente ler o próximo capítulo. Usa alguma dose de humor e quebra de expectativas, enquanto brinca com clichês do gênero.

Bem, mas vamos dar um passo atrás e falar um pouco sobre o assunto do livro. Guerra do Velho é um romance de ficção científica militarista com a seguinte premissa: as pessoas que se alistam para as forças armadas, na Terra, o fazem aos 75 anos de idade, com a promessa que seus corpos serão rejuvenescidos para ter condições para servir às Forças de Coloniais de Defesa.

Neste contexto, conhecemos John Perry, um idoso, civil, viúvo, que se alista para ingressar nessa nova etapa de vida. John tem uma personalidade cativante e faz o papel daquela pessoa que não sabe nada sobre o que vem adiante, a ajuda o leitor a descobrir, aos poucos, a realidade deste universo fictício. Neste aspecto, o autor é quase didático em muitos pontos, mas acaba sendo uma ótima estratégia para fazer o leitor aprender e se envolver com o universo ficcional.

As pessoas da terra sabem pouco sobre o que se passa no espaço distante, onde a humanidade vem estabelecendo colônias. Sabe-se que há conflitos com alienígenas, e não muito mais que isso.

Veladas sobre o cenário fantástico, estão algumas críticas sociais em relação às guerras e, em especial, quanto a como somos preconceituosos e as consequências ruins que o preconceito pode trazer.

Acho que não cabe falar muito mais, porque boa parte da graça do livro é o processo de descoberta e envolvimento com a trama. Não é nem longo e nem curto demais, outro excelente ponto a favor para um primeiro livro de uma série. É ótimo que tenha continuações, mas não é o tipo de livro que termina pela metade, conta uma história completa deixando espaço aberto para as sequências. É uma ficção científica permeada por humor cativante e que poderá agradar até mesmo pessoas desacostumadas com o gênero. Fica minha recomendação deste excelente livro com cinco estrelinhas.

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Lobo de Rua – Jana P. Bianchi

Este é um livro curto (novella*). Conta a trajetória de um garoto de rua de São Paulo que se descobre afetado pela maldição da licantropia. Um garoto duplamente azarado, primeiro por ser miserável e segundo por adquirir uma maldição bastante dolorosa.

No universo fantástico da autora, já existem lobisomens a incontáveis gerações e algum conhecimento sobre eles é reunido por estudiosos do assunto. No início de cada capítulo há um trecho da obra Novus Codex Versiopelius de um desses estudiosos, Caetano Estrada. Essas pitadas de conhecimento sobre a maldição ajudam o leitor a construir a visão deste mundo alternativo, e também dão uma prévia dos próximos temas que serão abordados.

O livro traz algumas ideias próprias que diferenciam o que conhecemos sobre lobisomens no folclore das criaturas que habitam esse mundo. Isso, junto com uma versão bem brasileira dos fatos, ajudam a dar um frescor especial para o livro.

A trama gira em torno do garoto Raul, que está sofrendo com suas primeiras transformações durante as luas cheias, e Tito Agnelli, um lobisomem experiente que resolve ajudá-lo. O livro consegue passar muito bem a mensagem do porquê a licantropia é chamada de maldição.

A trama segue em torno da dupla, mas há alguns personagens, como a cigana Soraia, que se inserem na trama ajudando-a a avançar.

A autora explora bem os sentidos para construir a ambientação e situações, e para mim, o ponto mais forte da obra é sua prosa muito fluida que faz o livro ser lido facilmente. É um livro certamente sombrio, com uma qualidade brutal e pode ser visto como uma fantasia urbana brutal. Vale notar que com a presença de poucas personagens femininas.

Talvez, o que não gostei tanto, foi o próprio desfecho. Certamente surpreende, mas não correspondia à expectativa que foi sendo construída ao longo da trama.

Ainda assim, deixo a minha recomendação. É de leitura rápida, bem escrito, faz uma boa adaptação do mito do lobisomem para a realidade brasileira e gera uma curiosidade quanto a elementos que poderão vir a ser expandidos se forem publicadas mais obras neste mesmo universo ficcional.

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*Novella: livro com tamanho entre  17.500 e 40.000 palavras.

Neon Azul – Eric Novello

Não tinha uma expectativa clara quanto a esse livro, mas posso dizer que fui surpreendido, muitas vezes, durante a leitura. Neon Azul é o nome de um bar em torno do qual ocorrem várias histórias relacionadas. De início, a coisa toda pareceu um pouco confusa, não estava claro que seriam diversas narrativas com pontos de vistas diferentes. O Neon Azul é apresentado por um mendigo, que adotou o local para ser um ponto de obter esmolas. Achei legal uma história contada do ponto de vista de um mendigo, não é algo comum de se ver e fiquei imaginando até onde iria a narrativa. Com a primeira mudança de ponto de vista, ficou claro que não iria muito longe, afinal, ele não era mesmo o protagonista do livro, mas sim o próprio estabelecimento, o Neon Azul.

Então, no segundo capítulo, apertamos o botão de reset e começamos tudo de novo, só que não. O romance não é apenas uma colagem de contos, ou mesmo uma antologia em torno do mesmo tema, mas uma espécie de mosaico no qual cada capítulo vai explicando um pouco mais da história. Uma boa parte dos personagens, que aparecem em cada narrativa, vão revelando aspectos interessantes dos demais. E próximo ao final, o leitor vai ganhando uma visão de quebra-cabeças que vai se montando e dando um sentido ampliado ao conjunto.

A variação de personagens e temas tratados na narrativa é bastante interessante mostrando que o autor tem habilidade para expor e construir, num curto espaço, uma nova personagem e também situação de conflito que enfrenta.

Sabia que a obra vinha com a classificação de fantasia urbana, mas demorou um pouco até que o aspecto fantástico se revelasse. O aspecto fantástico inclusive é sutil e aparece com mais força em duas das narrativas.

É um livro recheado de personagens vívidos e algumas situações bizarras. Há presença de uma atmosfera noir, em torno do bar/boate/piano bar, mas é notável a surpresa que traz cada um dos personagens que entra em cena a cada mudança de capítulos. É como ler vários livros dentro de um, e ainda sim, tendo-se a impressão de unidade devido aos sutis cruzamentos entre as tramas das personagens.

Enfim, foi o primeiro livro que li do autor, me surpreendeu muito em relação à qualidade da prosa, forma peculiar de descrever situações e psique de seus personagens, além de acrescentar uma atmosfera misteriosa (sem um mistério propriamente dito) sobre qual será o próximo personagem e que novidade ele irá trazer.

Não que isso seja uma coisa ruim, mas ao final da leitura, ficou para mim uma sensação de querer saber mais sobre um dos personagens, o misterioso dono da boate conhecido apenas como O Homem. Então, se você busca uma história onde os arcos se fecham e tudo fica bem explicado, pode não ser o livro para você. Fora isto, gostei bastante e recomendo.

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