O que dizer sobre este livro? Em primeiro lugar: é muito bom! Foi escrito mais ou menos na mesma época em que o Senhor dos Anéis (pelo menos, foram ambos publicados no mesmo ano, 1954). Seu autor, Poul Anderson (1926 – 2001) foi um escritor norte-americano da Era Dourada da ficção científica, mas também escreveu alguns livros de fantasia. Este foi seu primeiro livro de fantasia após estabelecer-se como um escritor bem sucedido de ficção científica. Ele deve ter escrito uma boa centena de livros e recebeu diversos prêmios, como o Hugo (sete vezes!).
Tem uma narrativa bastante sombria e adulta e talvez a precursora de contos de fantasia neste subgênero. Muitos autores já citaram que este livro foi uma inspiração, ou mesmo referência, entre eles, Michael Moorcock. A história tem muitos elementos pesados e imagino que teriam sido mais pesados ainda na década de 1950, quando foi lançado. Ou seja, não é uma leitura recomendável para jovens leitores. No pano de fundo, há citação de algumas situações históricas, mitologia e cultura nórdica, céltica, escocesa e inglesa e lendas de fadas. No primeiro plano, personagens brutos e violentos que demonstram inveja, luxúria, vingança e amor.
O romance conta a história de Skafloc, um homem que é raptado quando bebê e antes de ser batizado. Imric, seu raptor é um conde entre os elfos que governa o território da inglaterra, cria o rapaz como seu filho adotivo. Um humano entre os elfos poderia representar uma vantagem no conflito travado entre elfos e trolls há muitas gerações. Porém, Imric não poderia apenas roubar uma criança humana, portanto ele o substitui por um changeling, um filho próprio seu com uma troll louca que o conde mantém na masmorra de seu castelo. A história se passa na Inglaterra, Irlanda e alguns países nórdicos e se passa ora no mundo dos homens e ora em Faerie, um local místico que somente seres míticos podem enxergar e uns poucos humanos dotados de “visão de bruxo”. Interessante é que aqueles que não a possuem enxergam no lugar de um castelo ou fortaleza, montanhas de formato curioso.
O verdadeiro pai de Skafloc, Orm, é um guerreiro nórdico que resolve se estabelecer na Inglaterra após suas conquistas e acaba se casando com uma moça que adotou a religião cristã. A conquistada por ele era o lar de um pequeno senhor Inglês cuja família inteira é morta por Orm exceto por sua esposa vende a alma ao diabo, se torna uma bruxa e jura vingança contra Orm e toda sua descendência. No contexto da história, o “Cristo Branco” e sua religião que se espelhava pela Europa era responsável pelo enfraquecimento e eliminação dos povos míticos de Faerie da face da terra.
Na cerimônia de nomeação de Skafloc, um mensageiro dos Aesir, Skirnir presenteia a criança com uma antiga espada de ferro quebrada em dois pedaços. Em realidade uma espada de natureza maligna quebrada pelo próprio deus Thor e que um dia o rapaz resolve unir para cumprir um destino cruel. Do outro lado, entre os humanos, o changeling Valgard cresce um rapaz brutal o que agrada seu pai mas desagrada sua mãe. Valgard acaba cometendo crimes terríveis (induzidos pela bruxa) e parte numa jornada para juntar-se aos trolls.
A descrição e modos de agir dos elfos e trolls que o autor cria é muito diferente das usuais. Ambos são bastante inteligentes, organizados em civilizações porém amorais e orgulhosos. Ambos escravizavam raças menores que utilizavam em seu favor e nos conflitos. Há grande contraste entre a moral pagã destes seres e a moral cristã dos humanos que aparecem na narrativa. E do meio de uma guerra de vida ou morte para as nações élficas e dos trolls, o autor ainda encaixa de forma bem sucedida uma história de amor, bastante trágica, mas uma história de amor.
Uma sensação curiosa (e que se repetiu várias vezes) que tive lendo este livro era de que o livro teria de acabar, ou iria acabar logo, mas eu sabia que não. Senti isso de um terço até dois terços da evolução do enredo. A todo momento a narrativa parecia ter chegado a um beco sem saída. Eu pensava: “não vai ter jeito de continuar… está tudo acabado!”, mas alguma surpresa levava a história adiante.
A edição que li foi a revisada pelo autor em 1971. Muitos críticos (e o próprio Moorcock) dizem que a revisão empobreceu a obra original, o autor sustenta que não. Independente disso, The Broken Sword possui todos elementos de uma boa história de fantasia unindo magia, heróis, vilões, armas mágicas, criaturas e monstros míticos. É também uma obra de contrastes com momentos muito tensos intercalados por passagens mais amenas e tradições pagãs amorais contrastadas com a moral cristã. Enfim, é um grande clássico da literatura de fantasia e eu confirmo a indicação de Stephen E. Andrewsand e Nick Rennison como um dos 100 romances de fantasia que você deve ler (100 Must Read Fantasy Novels).
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