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As Melhores Novelas Brasileiras de Ficção Científica

Bem, depois de um hiato em relação às resenhas anteriores, chegamos ao último exemplar dessa coleção. Diga-se de passagem, o hiato foi geral em relação a resenhas durante a pandemia. Já vimos aqui as coletâneas organizadas por Roberto de Sousa Causo, Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica, e a edição extra, Fronteiras.

Cabe exaltar o fato de que se não fosse pelo trabalho de pesquisa e organização da obra por Roberto de Sousa Causo, muitos não teriam a chance de ter acesso e ler essas pérolas da literatura nacional de FC.

Nesta edição temos quatro histórias de tamanho médio, maiores que contos e menores que romances, vamos a elas. Na minha percepção, nenhuma delas chegou a explorar elementos de ficção científica mais a fundo, com elementos científicos/tecnológicos propriamente ditos, todas são histórias especulativas mais próximas ao realismo fantástico.

Zanzalá (1936) – Afonso Schmidt

Este texto de 1936 é uma viagem que nos leva a uma sociedade utópica situada em Cubatão em 2028. Vemos alguns elementos de evolução tecnológica como a eletricidade transmitida pelo ar. Vemos uma comunidade de artistas e agricultores vegetarianos que levam uma vida simples, como a de uma comunidade alternativa da “nova era”, com as necessidades básicas bem resolvidas. Uma espécie de visão de futuro anacrônica cuja evolução tecnológica não foi a mesma que vivenciamos. 

Somos apresentados a um jovem casal que pretende adquirir matrimônio, sendo a esposa uma bailarina, Tuca, que tem sua morte prevista pelo médico do comunidade. Apesar disso, seguem com os planos, vivendo o que ainda resta com alegria e certa resignação. 

Há uma sequência muito interessante na qual um gênio musical ignorado, alguém que fazia o papel de louco ou mendigo, compõe uma sinfonia baseada nos sons dos ventos e outros sons da natureza chamando a atenção de todo o mundo para aquela comunidade.

Porém, um povo estranho, os “caborés” que nunca aceitaram aquele tipo de evolução compartilhada por quase toda a humanidade entra em conflito com essa comunidade. O combate toma proporções turísticas atraindo povos de todo mundo que não viam a violência se manifestar assim há um bom tempo. 

O texto evoca sensações de estranhamento, mas muitas coisas tratadas nele, incluindo esse conflito final não chegam a fazer muito sentido.

A escuridão (1963) André Carneiro.

Este texto narra a forma que uma escuridão lentamente toma conta do mundo e as consequências disto. Não só a luz do Sol desaparece, mas também todas as formas de energia, como o fogo. Com a escuridão instalada, coisas terríveis acontecem e cabe aos cegos ajudar algumas pessoas a superar essa terrível situação.

O autor tem uma narrativa envolvente, e apesar do absurdo da situação, leva a curiosidade do leitor a buscar pelo desfecho. Texto muito bom e envolvente!

O 31º. Peregrino (1993) Rubens Teixeira Scavone

O texto narra fatos em torno de uma peregrinação religiosa no século XIV à qual um escritor se junta. Realmente não entendi bem a seleção deste texto para a coletânea. Há um relato de uma grávida sobre contatos com anjos e possessão demoníaca, supostamente algo que deveríamos relacionar com extraterrestres? Confesso que não gostei muito do texto, mas talvez possa agradar a outros leitores.

A nós o vosso reino (1998) Finistia Fideli

Uma assistente social espírita é convidada a conhecer um guru e se envolve num culto do tipo “Nova Era”. Ela se envolve no trabalho social promovido pelo grupo, entretanto há uma presença estranha entre os membros desse grupo. Seria um demônio? Ou alienígena? 

O texto é bem escrito e prende a atenção. A personagem é forte e madura, tem ideias próprias e perto ao final, precisa agir a fim de evitar o estabelecimento de um mal maior.

A coletânea de textos de ficção especulativa de tamanho mediano, é sim uma janela de visão para a produção nacional, apesar de não serem textos com fortes características da ficção científica como a que vemos em períodos semelhantes na literatura norte americana e inglesa. Vale conhecer os textos nela contidos, são interessantes e bem escritos. Ainda que acredite que poderia ter sido selecionado um outro texto para ocupar o espaço da obra “O 31º. Peregrino”.

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A Última Colônia – John Scalzi

Começando de trás para a frente, me senti desapontado ao ler o posfácio no qual o autor diz que iria dar um tempo da série para visitar outros mundos e personagens. O universo que ele criou a partir de Guerra do Velho é realmente fascinante e me fisgou como leitor como poucos outros livros o tem feito nesses últimos anos. Mas felizmente, após uma rápida pesquisa na internet, descobri que depois deste, ainda publicou três livros neste universo: Zoe’s Tale (2008), The Human Division (2013) e The End of All Things (2015). UFA! Agora posso continuar, apesar da curiosidade pelo que ainda vem por aí….

Em A Última Colônia reencontramos John Perry e Jane Sagan, agora vivendo pacificamente em uma das colônias com sua filha adotiva Zoe. Uma vida pacata e até feliz… Recompensa merecida após tudo o que passaram em Guerra do Velho e As Brigadas Fantasma.

Mas relativa paz da família não duraria, afinal, ainda não era o fim de suas histórias. Convocados pela UC, o órgão que administra as colônias,  aceitam embarcar numa nova missão: auxiliar a implantação de uma nova colônia. Daí para frente, surgem inúmeros complicadores e, como já era esperado, conspirações, segredos de estado, dilemas morais e até mesmo, batalhas das quais todo o destino da humanidade poderá depender.

O contexto geral ainda é o mesmo, centenas de espécies alienígenas competindo por espaço e recursos escassos distribuídos na galáxia. Os humanos conseguiram alguns aliados, mas neste momento, estão para enfrentar uma ameça ainda maior, uma forte aliança entre povos alienígenas. E estes estão a um passo de colidir diretamente contra a humanidade.

Este livro fecha muito bem a série, e me deixou novamente impressionado com a capacidade do autor de tecer tramas, construir personagens consistentes e criar expectativas e tensões crescentes. Li praticamente em apenas dois dias.

Essa é uma série de leitura obrigatória para quem quer se entreter, e como já disse antes, uma ótima porta de entrada para o gênero de ficção científica, para aqueles que ainda não tiveram oportunidade de conhecê-lo. Recomendo fortemente!

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Mitsar – Studio Seasons

A edição de Mitsar que adquiri (no FIQ2018) é uma revista em formato grande (27,5×20,5cm) um pouco incomum para um mangá, mas que permite ao leitor apreciar com maior detalhe a bela arte de Sylvia Feer. Contado com roteiro de Montserrat, a história foi originalmente publicada em 18 partes na revista Neo Tokyo.

O mangá conta a história de Khemis de Hadjut, o filho mais jovem do rei Fonduk. (Hadjuts são humanoídes com chifres…) Sem interesse pelo trono de seu pai, ele está tentando se provar como um piloto de corridas. Na história ele leva uma ideia  de nova máquina para Prudon, o melhor construtor da cidade de Cheurfa.

Também participa da trama a princesa Daya, herdeira de Oásis. Sua raça possui magia e ela conta com uma flauta para canalizar seus poderes. Ela também uma das participantes da centenária corrida de Mitsar. Mas essa corrida não vai ocorrer sem que alguns obstáculos precisem ser superados! Eles precisarão se cuidar com o Grande Mormik, um ambicioso líder religioso que pretende dificultar as coisas para Khemis.

A arte é muito bonita e detalhada, sendo que a variação de um traço realista convive com os traços de humor escrachados que surge para dar ênfase a piadas e emoções.

Se você aprecia mangás, essa revista é certamente uma que merece um lugar em sua coleção! Aproveitem que está em promoção na loja!

Visite o hotsite de Mitsar no site do Studio Seasons, para mais informações e extras.

Mistério de Deus – Roberto de Sousa Causo

Mistério de Deus é um romance de fantasia urbana ambientado na cidade de Sumaré, interior de São Paulo, no início dos anos 1990.  A trama se desenrola numa cidade do interior que representa bem um microcosmo do Brasil. Onde vemos gente honesta e trabalhadora, desigualdade social, violência urbana, políticos e polícia corrupta e traficantes de droga. Ali, a Gangue do Maverick ronda a região num possante e envenenado carrão preto, assassinando pessoas sem relevância social, como indigentes e prostitutas e os coletando seus corpos para fins macabros. O protagonista do livro, Alexandre Agnelli, tinha acabado de sair da prisão, e sua aparência e situação lhe conferiam o perfil perfeito para se tornar mais uma vítima dos assassinos, mas escapa por pouco e toma como missão pessoal, enfrentá-los.

O romance é volumoso (600 páginas) e numa narrativa progressiva, introduz lentamente elementos do sobrenatural e horror. Ligados por laços de amizade, amor e do destino, outros três personagens se juntam a Alexandre nessa cruzada contra as trevas. Seu melhor amigo, João Serra, sua ex-colega de escola, Soraia Batista e o policial militar novato Josué Machado. 

Serra é apaixonado por automobilismo e possui um carro preparado, um Dodge Charger branco. Ele também já teve experiências como piloto profissional e já foi um dos mais famosos corredores de racha da região.

Soraia sempre foi a paixão de Alexandre, desde que eram mais jovens, é uma professora de inglês de escola pública e descobre, ao longo da trama, possuir mediunidade ostensiva, de modo que é ela que vem a descobrir pistas de algo sobrenatural e sombrio ligado às atividades da Gangue do Maverick. 

Por último, Josué é um policial recém formado, honesto, idealista e temente a Deus, que passa a ter sérios problemas adaptação junto aos policiais corruptos com que precisa trabalhar.

Algo muito interessante e que dá o colorido da obra é a exploração da subcultura de carros preparados (muscle cars) e corridas ilegais. Neste aspecto, o livro rende boas cenas de ação com características cinematográficas. Por outro lado, o livro é bastante ancorado na realidade brasileira e dá ao leitor, mesmo sem nunca ter visitado Sumaré, uma noção muito próxima daquela realidade, na medida em que usa bem a extensão do livro para propor um mergulho em personalidades, estabelecimentos, bairros, etc. Assim constrói uma imagem forte não só da cidade, mas de seus habitantes e de alguns aspectos da cultura nacional. Se o romance Xógun, de James Clavell dá ao ocidental uma possibilidade de mergulho profundo no Japão medieval, Mistério de Deus proporciona ao leitor um mergulho semelhante num recorte do microcosmo brasileiro do início dos anos 1990.

Outro aspecto que vale destacar e elogiar no romance é o estudo de personagens. Alexandre, Soraia, Serra, Josué, dois dos antagonistas, e diversos outros personagens secundários, são muito bem trabalhados. Nós vemos personagens tridimensionais, redondos, com perfis psicológicos diversos, fraquezas e hesitações que os tornam muito críveis e humanos.

O livro não se resume a uma caça e investigação em linha reta que levaria à solução do mistério em torno da gangue do Maverick. A linha de investigação leva a caminhos incertos e desenvolvimentos secundários e também, à própria construção de elos entre os personagens. A forma com que o relacionamento entre os personagens evolui, em paralelo às investigações, é cativante, de modo que é tão interessante desvendar o mistério, como observar a evolução nos arcos dos personagens. Dentro desse espírito de fazer a trama maturar lentamente são revelados outros personagens, como políticos e traficantes que Alexandre e Serra confrontam, mesmo antes de terem elementos suficientes para partir para o confronto derradeiro e da entrada do romance no segmento onde se explicita o aspecto de horror e sobrenatural. Para aqueles que apreciam o gênero de horror, vale o aviso de que a presença direta desses elementos é reduzida, mas quando surge, causa forte impressão. A revelação final e o próprio confronto com a criatura por trás da Gangue do Maverick também possui fortes características gráficas e as descrições dariam ótimo lastro para uma adaptação da obra para filme ou minissérie.

O livro tem ligações com o romance Anjo de Dor (2009), que ainda não lemos, e o tipo de narrativa dialoga com com o romance de fantasia urbana, A Corrida do Rinoceronte (2006), ainda que este último seja um romance muito mais curto.

O autor de Glória Sombria e Mestre das Marés, que são parte de uma das mais empolgantes séries de ficção científica nacional, mostra, nesse romance, outro aspecto de sua versatilidade, uma capacidade de mergulho mais fundo na psique dos personagens criados e também a forma crua e explícita de descrever o horror sobrenatural.

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Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica: Fronteiras – Org. Roberto de Sousa Causo

Seguindo minha investigação da produção da FC brasileira, terminei de ler o segundo volume da antologia organizada por Roberto de Sousa Causo. No volume anterior, tivemos contos de Machado de Assis, Gastão Cruls, André Carneiro, Rubens Teixeira Scavone, Jorge Luiz Calife, entre outros. 

O segundo volume traz 14 contos e trabalha com o conceito do “fronteiriço” entre a FC e outros gêneros, mas também fronteiras no sentido do limite tênue entre a realidade concreta e realidades alternativas. É uma janela diversificada de contos que abre a mente do leitor para algumas das possibilidades já foram exploradas pelos autores brasileiros. Temos contos de autores que normalmente não são associados à FC como Lima Barreto e Lygia Fagundes Telles. Soma-se a eles o retorno de Braulio Tavares, Rubens Teixeira Scavone, Jorge Luiz Calife e autores ainda não apresentados como Berilo Neves, Leonardo Nahoum, entre outros.

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